quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Minha mãe tem que ser Capa de Revista!!!


Minha mãe, eu e meu irmão, Ricardo dos Anjos
Por que minha mãe merece 
ser Capa de Revista??

            Assim que me deparei com esta frase, pensei: Meu Deus, essa capa é prá minha mãe!!! Claro que como filha meu primeiro pensamento foi... “Ninguém merece mais do que ela!!!!” É lógico que todas as redações que chegarem até vocês terão em mente essa mesma certeza. Mas eu vou contar porque minha mãe realmente merece ser a capa do Globo Baixada.
            Minha mãe chama-se Ivone, nasceu há 58 anos em uma família muito pobre de cinco irmãos, sendo ela e meu tio Ivan irmãos gêmeos. E como era comum naquela época tão difícil, a saúde de um dos gêmeos não era nada boa. E a mais frágil era a minha mãe, a caçula dos dois. Ainda bebê ela teve que enfrentar vários problemas de saúde, uma bronquite que a deixava mais no hospital do que em casa durante toda a infância. E todo esse quadro acabou por fazer parte de toda a sua vida. Sempre com aparência frágil e franzina, debilitada devido há tantos problemas de saúde, era sempre alvo das preocupações de minha querida e amada avó, que lutava com tanta dificuldade prá criar junto com meu severo avô, os cinco “anjinhos”!! Mas na verdade aquela “aparência” frágil nada tinha a ver com toda a força, a coragem, e ousadia que seriam a marca registrada da minha mãe!
            Aos dezessete anos, muito arteira e espevitada (era assim que se dizia naquela época rsrsrs), minha mãe engravidou de mim... Não foi uma boa maneira de começar a vida, mas enfim, lá estava eu... eu e ela. Sem o um pai que assumisse a sua responsabilidade, minha mãe teve que enfrentar a toda rigidez e intolerância de meu avô, que na época já era um pastor evangélico conhecido e respeitado na cidade (Queimados/RJ) onde moravam. Minha vozinha querida sempre amorosa e tolerante, assumiu a minha criação ajudando a minha mãe que era só uma menina sem juízo, fruto de uma educação muito severa e opressora. Durante uns seis meses minha mãe chegou a cair no mundo e eu fiquei só com minha avó, que nunca desistiu de fazer o que era certo mesmo que isso trouxesse prá ela conseqüências terríveis. Quando eu tinha três anos, minha mãe conheceu o pai do meu irmão do meio, um homem que parecia gostar muito dela e decidiu assumir a minha paternidade (até agora sem reconhecimento e sem registro). Logo minha mãe engravidou, e nasceu meu irmão Ricardo e nós nos mudamos.
                        Minha mãe se recuperando de  uma de suas tantas batalhas!!
            Parecia que a vida ia nos dar uma chance de sermos uma família de verdade, apesar de todo aquele começo meio “torto”. Mesmo tendo que assistir muitas vezes minha mãe ser internada em hospitais por longos períodos devido a graves problemas de saúde, eu e meu irmão tínhamos uma infância privilegiada materialmente, pois meu padrasto era um arquiteto projetista da antiga RFFSA. Mas não demorou muito e logo o marido da minha mãe mostrou as suas garras, e passou a mostrar-se extremamente ciumento, e durante os oito anos em que viveram juntos, não houve uma semana sequer que ele não a espancasse, na minha frente e na frente de meu irmão!! Presenciamos cenas horríveis de tentativas de homicídio e parávamos numa delegacia, e várias vezes tivemos que sair de casa de madrugada fugidos para não sermos mortos pela insanidade daquele homem tão inteligente, tão culto, que na frente dos outros era um gentleman ! Eu nunca consegui entender porque ela não o mandava embora... Parecia tão fácil prá mim que era apenas uma menina.
            Finalmente, depois de minha mãe ter engravidado novamente, chegou o ponto final. Foi quando ele tentou matar minha mãe e minha irmãzinha que tinha apenas 15 dias de nascida... Aquilo foi demais prá minha mãe, ela não poderia suportar, conseguimos abrir a porta, já de madrugada, e fugimos, minha mãe com minha irmãzinha com a orelhinha ensaguentada nos braços, meu irmão e eu ainda de pijamas corríamos como desesperados pela Avenida Guadalajara tentando evitar que ele nos alcançasse, quase uns dois quilômetros até o centro de Nova Iguaçu, quando conseguimos ajuda de pessoas que saíam de bailes e ligaram prá nossa família. Aquele dia, meu tio querido, irmão de minha mãe, perdeu a paciência e o espancou no centro da cidade, assim que viu o nosso estado, meu e de meus irmãos... E finalmente ele foi embora e nossa família nos acolheu, meu avó agora menos intolerante, preferiu a filha viva e rebelde a vê-la acabar num triste fim!
            Bom, como meu padrasto não permitia que minha mãe trabalhasse fora, aos 32 anos, sozinha com três filhos, sem pensão alimentícia, minha mãe teve que começar do zero e enfrentou tudo o que tinha que enfrentar prá sustentar a mim e meus irmãos. Começou como manicure no Rio, e logo uma antiga conhecida lhe ofereceu um emprego de auxiliar de serviços gerais no Hospital Gafreé e Guinle, e minha mãe não pensou duas vezes, mesmo sendo uma mulher bonita, atraente e que tinha algum estudo, não hesitou e foi. E com o passar do tempo, com muito esforço, trabalhando e estudando, se formou em Enfermagem e passou para o Instituto Nacional do Câncer, onde amou e foi muito amada por todos. Mas lá também minha mãe, como conseqüência de todas as suas lutas, descobriu que tinha problemas na coagulação do sangue, e fatídica hérnia de disco que há deixou por um tempo em cadeiras de roda e segundo os médicos corria o risco de não andar mais... Mas foi aí que minha mãe descobriu que todos aqueles anos sendo levada, mesmo obrigada por meus avós à igreja, lhe dariam resultado... Ela acabou se revelando uma mulher de fé inabalável.... E antes que os médicos imaginassem ela já estava de pé, e mesmo aposentada pelo Inca, continuou a trabalhar de free-lancer. Pouco tempo depois, minha mãe conheceu um novo companheiro, com quem pode desfrutar com mais tranqüilidade da vida de casada.
            Até que um dia, meu padrasto começou a mostrar vários sintomas, a ter muitas dores no corpo, muito cansaço, e um emagrecimento repentino. Depois de ir a vários médicos e fazer inúmeros exames entre internações e voltas prá casa, em longos meses de sofrimento e preocupação, finalmente chegou o “veredicto”... Meu padrasto era portador do vírus HIV em estágio já avançado da doença... Não preciso dizer o quanto foi horrível e assustador! Porque isso significava que havia 99,9% de chances da minha mãe também ser portadora do vírus... e a notícia foi confirmada depois dos exames, minha mãe também é portadora do vírus HIV. Foi uma triste e perdida batalha, em quase dois anos minha mãe lutou incansavelmente, pela vida do meu padrasto, chegando a cuidar dele como se fosse um filho. Até que no ano de 2008, meu padrasto perdeu a batalha e veio a falecer! Foi uma pancada muito doída prá minha mãe que depois de tanto lutar tinha perdido o seu companheiro e isso ainda significava a certeza de um futuro muito assustador e imprevisível prá minha mãe. Era como viver com sapatinhos de lã, tomando muito cuidado onde iria pisar, porque todo lugar poderia ser muito perigoso prá ela. Como se não fosse o bastante, meu avó que tinha se tornado viúvo e passou a morar com minha mãe, pois minha querida avó veio a falecer em fevereiro de 2005, depois de muito castigada pelo Mal de Azheimer, ele também não suportou tanta saudade e dor, e meses depois veio a falecer por desistir de viver sem minha avó!!
Bom, vocês devem estar pensando..nossa isso parece novela mexicana!!! Pois é, mais é uma dura verdade.. E sabem porque eu pensei: Essa capa tem que ser da minha mãe? Porque hoje minha mãe mesmo sendo portadora do vírus HVI, é uma mulher de muita coragem, ousadia, que não cansa nunca, que ainda trabalha mesmo com tantos problemas de saúde, que acaba de entrar prá faculdade de Serviço Social, que não pensa duas vezes prá socorrer alguém que precisa de ajuda, que ajuda crianças vítimas de câncer necessitadas materialmente, que eu costumo dizer que ela tem pilha Duracell rsrsrsrsrsrs
            Ah como eu queria ser como minha mãe!!!! Valente e imbatível sempre!!! Hoje minha mãe é meu esteio, e me ajuda a criar meus três filhos sozinha, e eu não sei o que seria de mim sem ela hoje... E nem gosto de pensar nisso, pois eu conheço bem o que significa ser portador do vírus HVI.... O que vale é minha mãe ama intensamente e é amada na mesma medida por sua família e seus inúmeros amigos!!! Minha mãe merece ser a capa não porque teve uma história de vida triste, de muita luta e sofrimento, mas porque sobreviveu e e sobrevivi a todo e qualquer tsunami que a vida lhe impor!!!  A vida da minha mãe significa prá mim que:
As nossas marcas vão sempre denunciar onde nós estivemos,
mas elas não precisam determinar prá onde nós iremos!!
 Essa é a minha mãe trabalhando no Hospital onde hoje ela é paciente!!!

Meu nome é Rosemárcia Mendes e minha mãe é 
Ivone Coelho Mendes
(Obs: Hoje minha mãe se encontra internada no Instituto Nacional do Câncer...
 mas isso é só provar a minha fé, e Deus manifestar a Sua Graça , Poder e Glória Incomparáveis)

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